Sexta-feira, 4 de Junho de 2010
Há um mês, ao mesmo tempo que os gregos protestavam nas ruas contra as duras medidas impostas pelo governo de George Papandreou, nomeadamente sobre o aumento da idade da reforma de 61 para 63 anos, a maioria dos europeus experimentaria um ligeiro sentimento de indignação. "Mas de que se queixam eles - os gregos -, se eu só me vou poder reformar aos 65?", pensaria um português qualquer. Este raciocínio, escondido por muitos porque pareceria inveja, acabou por ganhar corpo de letra e as críticas espalharam-se pelos jornais. Na Alemanha, motor da economia europeia, onde a idade legal da reforma é aos 67 anos, pouco se guarda e perguntou-se mesmo se os alemães teriam de passar a reformar-se mais tarde, por exemplo só aos 69 anos, para que os gregos pudessem gozar em pleno a sua reforma. A diferença de direitos nos países da OCDE existe e em alguns casos é enorme. A idade média de reforma é de 64 anos, mas vai- -se dos 58 da Turquia aos 67 da Noruega ou da Islândia.
A verdade é que de pouco ou nada serve a queixa dos que julgam ser menos privilegiados. Os progressos feitos na ciência e na medicina resultam, é sabido, numa maior esperança média de vida e todos os anos se assiste à quebra da taxa de natalidade. Ora, isto, acrescido ao quase colapso dos sistemas de segurança social de alguns países, traça um destino: a idade da reforma vai aumentar, só não se sabe até quanto. Algumas sociedades de países desenvolvidos estimam que em 2050 o número de reformados será igual ao de trabalhadores activos. Especialistas reputados prevêem que, dentro de décadas, a necessidade faça com que uma pessoa de 85 anos se mantenha activa no mercado de trabalho.
O mundo tem mudado e vai mudar muito mais. Muitos ainda não se deram conta, porque só vão sentir o efeito de medidas já aprovadas daqui a uns anos, quando chegar a sua vez. Mas agora, no meio de uma crise gravíssima, a atenção é cada vez maior ao que nos acontece, a nós mas também aos outros. Não aos gregos, aos alemães ou aos espanhóis. O conflito latente não é entre países, a ameaça de conflito é entre gerações. A atenção tende a atingir quem está muito mais próximo - o colega de trabalho, o vizinho, o irmão mais velho ou o pai. À medida que se perdem direitos, que as regras se alteram para pior, que as dificuldades aumentam, as comparações são praticamente inevitáveis. Que sentirá hoje um jovem que não consegue encontrar emprego? Em Portugal, o desemprego entre os jovens supera os 20%. E um recém- -licenciado a quem sempre foi dito que uma licenciatura era uma espécie de livre-passe para o mercado de trabalho e um futuro promissor? Que respostas difíceis! Pode simplificar-se e dizer que o mundo mudou e que, quem sabe, se os governos se aperceberem da situação e efectuarem as reformas adequadas, talvez venha a ser mais difícil que alguém com 50 anos caia numa situação de desemprego de longa duração. Novos e velhos, nem todos votam, mas todos são importantes.