Terça-feira, 30 de Março de 2010

Pior é a desilusão de um quase

Hoje, apenas três dias depois de ter conquistado a liderança do PSD, Pedro Passos Coelho tem uma enorme vantagem em relação a José Sócrates. Ainda não desiludiu. Ninguém se ilude com quem não conhece, apenas com aqueles que pensa conhecer. E a verdade é que, apesar de Passos Coelho estar longe de ser um desconhecido na política, a maior parte das pessoas ainda o olha com curiosidade e expectativa. Mais não seja porque nos últimos dois anos não esteve em palco.

Com Passos Coelho ainda se está naquela fase em que se procuram tiques, apreciam-se as cores das gravatas, ainda se pensa "não sei se hei-de gostar ou não", a sua voz ainda não se tornou tão familiar ao ponto de irritar, é quase como se se tratasse de uma pessoa que acaba de chegar para passar a fazer parte da nossa vida. Pode parecer que não, mas tudo isto importa: a desilusão é dos sentimentos mais corrosivos, capaz de despertar coisas impensáveis.

Mas a partir de agora, Passos Coelho sentou-se numa cadeira - só agora todos o ouvirão - e todos os erros e falhas são a pagar, sem excepção. Há erros e erros. Há uns que nem uma vida chega para pagar.

Logo para começar, se se quiser assumir como uma alternativa de poder, o novo presidente do PSD jamais poderá mentir, enganar, prometer o que não poderá garantir ou esconder um passado duvidoso. Uma vez passa, duas ainda vai, mas à terceira já se sente e à quarta pode ser tarde de mais. É assim que costuma funcionar com a desilusão. Vistas bem as coisas, quase nunca é fulminante.

E é assim, tão simples. Passos Coelho não pode deixar tentar-se e tornar-se num ilusionista. Deve fazer aquilo que o governo ainda não foi capaz e explicar tintim por tintim a situação desastrosa em que o país se encontra. Com todo o tempo e detalhe do mundo. Mostrar o quadro inteiro, por muito agreste que seja, e depois concluir dizendo que, por nós, pelos nossos filhos e netos, não nos resta outra saída senão arregaçar mangas, fazer sacrifícios, no limite, sofrer. A todos, mas mais a uns que outros porque como sabemos - Passos Coelho sabe que sabemos - a austeridade toca mais a alguns. Nesta fase já não há expectativas para gerir.

Depois, o novo líder do PSD deve perceber que a oposição não se faz apenas de críticas, que quando se atira a uma medida do governo deve apresentar uma alternativa. Se não quer este Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) deve mostrar o seu, como pretende chegar a 2013 com um défice inferior a 3%. É fácil dizer-se que está ao lado da classe média, ameaçar com o chumbo de todas as medidas do PEC que a afectem, mas não apresentar fonte de receita ou corte de despesa substitutos é puro ilusionismo.

E mais: Passos Coelho deve conseguir resistir à sofreguidão de tantos que o ajudaram na vitória. É difícil ser ingrato, paga-se, mas todos sabemos - Passos Coelho sabe que sabemos - que há recompensas inaceitáveis.

E não acaba aqui. Se não quiser mais um, a vida de Passos Coelho pode ter recomeçado na sexta-feira e até se poderá guardar no fundo da memória tudo o que correu mal antes-das-directas-no-PSD.

publicado por Sílvia de Oliveira às 14:48
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Segunda-feira, 15 de Março de 2010

Os pequenos líderes

Apenas poucas horas depois do congresso do PSD, já não são os discursos dos candidatos à liderança do partido que saltam na memória. Ontem a aprovação da polémica proposta de Santana Lopes, que aperta a malha aos militantes que venham a criticar a liderança do partido, abafou qualquer espécie de ideia tentada no congresso. Ontem nem Aguiar-Branco e Paulo Rangel, nem mesmo Passos Coelho saíram do pavilhão multiusos Engenheiro Ministro dos Santos mais primeiros-ministros do que entraram. Espremida a matemática dos aplausos, dos sound bites e das gafes, fica a imagem de uma espécie de congresso dos pequeninos. Discute-se quem foi o vencedor do fim-de-semana como se alguma coisa de verdadeiramente marcante se tivesse passado, como se o que os distinguiu tivesse sido verdadeiramente importante. Não é o passeio confiante de Passos Coelho até ao palco, a descontracção oferecida por dois anos de trabalho ou a provocação a Sócrates acompanhada da tirada "não vamos andar com o PS ao colo" que o faz vitorioso do que quer se seja. Como também não é a resposta deselegante a Machete, quando este o avisou de que o seu tempo estava a chegar ao fim, nem a atabalhoada tentativa de pazes com Alberto João Jardim que mancharam o percurso de Passos Coelho. O mesmo se pode dizer em relação a Rangel e à sua "dessocratização" e inesperada insegurança, ou em relação à expectável fleuma de Aguiar-Branco, que repetiu até à exaustão que sabe o que quer para o partido e para o país. A verdade é que em dois dias de reunião social-democrata só se passaram coisas pequenas, nada que indicie que quem vencer as directas de dia 26 não será apenas líder do PSD, mas também um bom candidato a primeiro-ministro, capaz de fazer frente a um Sócrates indiscutivelmente debilitado. A história deste congresso do PSD é desinteressante, é a história de um partido órfão, é a história de pequenos líderes. É verdade que, como dizia José Miguel Júdice na entrevista ao i, por vezes somos surpreendidos, eles superam-se, agigantam-se. Alguém se lembra dos candidatos a líderes partidários Cavaco Silva, agora Presidente da República, Durão Barroso, agora presidente da Comissão Europeia, ou José Sócrates, agora primeiro-ministro. Também se dava pouco por eles, é verdade, e hoje é o que é. É então isto que se pode esperar, para já, ficar à espera da surpresa, acreditar que, como disse Marcelo, o PSD tem ideias, força e unidade para disputar eleições e até vencer com maioria absoluta, dar a volta a Portugal. Mas como Marcelo também disse, isso não se faz apenas com a mudança de gente, também é preciso mudar a forma de fazer política. Um líder não se faz sozinho. Como lembrou Marques Mendes, exigir-se-á aos derrotados lealdade, solidariedade e respeito porque, como disse, ninguém acreditará que o PSD será capaz de governar o país se não mostrar que se governa a si próprio. E ontem, no fim dos trabalhos em Mafra, a falta de unidade continuava a perseguir o PSD como uma nuvem negra e carregada. E não se vai lá com silêncio forçado.
publicado por Sílvia de Oliveira às 14:48
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Quinta-feira, 11 de Março de 2010

Sente a falta do seu helicóptero?

"Sente a falta do helicóptero para ir trabalhar?" A resposta à pergunta do economista João Duque foi um pronto e óbvio "Não!". Mas talvez a resposta de Jardim Gonçalves não tivesse sido esta. O fundador do BCP dispunha de um e até há bem pouco tempo, mesmo depois de ter deixado a liderança do banco, podia usá-lo nas suas deslocações. Ou seja, só sente a falta quem já teve, no limite, só sofre quem se habitou a ter. Helicópteros, carros topo de gama, viagens para as Caraíbas e plasmas, mas não só. Esta crise internacional e a nossa crise - já a tínhamos, não vale dizer que foi inventada - já roubou e vai continuar a roubar coisas bem mais triviais e importantes, como a possibilidade de comprar ou continuar a pagar a prestação da casa, e até o direito a um emprego. Ainda ontem a OCDE, ao mesmo tempo que elogiava o Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) português, avisava que a recessão limitou o potencial de crescimento da economia nacional no longo prazo e encolheu o mercado de trabalho. Será a partir de agora - ironias da vida -, quando o governo recebe elogios pelo seu PEC, que a crise vai doer a valer a cada vez mais pessoas. Salários congelados, mais impostos, cortes nas prestações sociais, juros mais altos, crédito mais difícil e mais caro. É o que está para vir. Se ainda não está convencido que terá de apelar ao espírito de sacrifício, lembre-se do que disse anteontem Vítor Constâncio. O governador do Banco de Portugal e futuro vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE) afirmou sem rodeios que todos terão de estar preparados para aceitar mais medidas de austeridade. Mais ainda. E Constâncio é conhecido por preparar terreno. Se ninguém o avisou, nem mesmo o primeiro-ministro, fique a saber que o nível de vida de muitos portugueses vai piorar. Logo agora que alguns nos querem convencer, há já alguns meses, que a recuperação económica já começou. É verdade que se viveu numa riqueza artificial e que a alienação tem sempre um custo, mais que não seja o confronto com a realidade. Mas não é por ter sido assim que passa a ser justo dizer a alguém que afinal não podia ter assinado o contrato promessa de compra e venda da sua casa porque, já devia saber, não vai conseguir continuar a pagá-la... E muito mais difícil será um putativo proprietário viver com a ferida das dívidas. O PEC pode ser aprovado, abençoado por Bruxelas, sossegar as agências de rating e afastar o fantasma grego; Portugal pode não ter de ouvir o desplante de Angela Merkel sugerir que venda algumas ilhas; Sócrates até pode pendurar a medalha quando em 2013 mostrar ao mundo um défice de 2,8% e gritar de vaidade que o seu governo conseguiu fazer o que devia para bem do país e de todos os portugueses. Mas e até lá? Bem, até lá, há que aguentar, dirá, o país não pode continuar a viver acima das suas possibilidades. Mas e depois? Bem, depois, dirá, logo se vê, nem sei se ainda cá estarei. Governar não é isto. Portugal não se tornou ingovernável assim a partir do nada, os governos é que não souberam governá-lo. Mas como são os governados que elegem os governantes - era muito bom que assim continuasse -, o melhor mesmo é abrir os olhos - a televisão e os jornais não mostram nem metade -, observá-los em pleno acto. Ser governado dá trabalho mas talvez valha a pena e possa evitar surpresas destas, senão aos nossos filhos, pelo menos aos nossos netos. Por eles, vale a pena.
publicado por Sílvia de Oliveira às 14:47
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Terça-feira, 2 de Março de 2010

Sócrates não vive na Madeira

Um grupo alargado de entendidos quer à viva força convencer o país que no actual momento de crise não se pode mudar o líder... porque a crise, já de si grave, poderia degenerar numa catástrofe de insondáveis dimensões. Explicam assim os ditos especialistas, imbuídos de enorme convicção e responsabilidade, que dada a actual situação da economia portuguesa o pior que poderia acontecer, neste momento, a Portugal e aos portugueses era serem abandonados por José Sócrates.

Os especialistas não podiam deixar de estar mais certos e ao mesmo tempo completamente enganados. Não há a menor dúvida que uma crise política que resulte na saída de Sócrates é indesejável, mesmo muito indesejável. O governo acabou de ser eleito - só passaram cinco meses -, o Orçamento do Estado não foi aprovado pelo Parlamento e o Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC) ainda não foi entregue, não foi escrutinado por Bruxelas nem pelos investidores e agências de rating. Isto numa fase em que Grécia e Portugal parecem, para quem vê de fora, irmãos gémeos. Se José Sócrates saísse, a economia portuguesa sofreria, sem dúvida, danos imediatos. Nesse cenário, a desconfiança dos investidores em relação à capacidade de Portugal organizar as suas contas públicas aumentaria. Os custos estariam à vista de todos, com a subida do preço do dinheiro à cabeça. A saída de Sócrates - de Sócrates porque é ele o primeiro-ministro - é por isto e muito mais indesejável. Estão certos os tais especialistas. Os principais partidos e o Presidente da República não teriam, nesse caso, um minuto a perder, só teriam tempo para encontrar uma solução credível que garantisse que, mesmo sem Sócrates, Portugal não se desviaria da trajectória de redução do défice orçamental e da dívida pública, nem da estratégia de recuperação da economia. Difícil missão, sem qualquer espécie de dúvida.

O que o grupo de entendidos não explica é que Sócrates só é desejado, só é importante para o país e para os portugueses enquanto transmitir confiança e credibilidade. Se o filme das escutas e do "plano" do governo para controlar a TVI e outros órgãos de comunicação social continuar numa escalada de terror género gore, se o primeiro-ministro sair cada vez mais fragilizado e desacreditado, deixa de ser uma garantia do que quer que seja. Não se pense que por estarem longe e, por isso, não assistirem aos mais sórdidos pormenores de todas as cenas deste assustador argumento, os responsáveis da Comissão Europeia, das agências de rating e os investidores vão continuar a acreditar e investir num país com um líder quebrado. É aqui que os especialistas entendidos na governação se enganam. É do senso comum que a ausência temporária de um líder é menos nefasta que a persistência de um líder frágil por tempo indeterminado.

Nem a crise, por muito grave que seja, torna Portugal e os portugueses reféns de um qualquer primeiro-ministro. Ainda não chegámos à Madeira, onde Alberto João Jardim, imagine-se, impelido pela mãe natureza se sente na obrigação de (re)repensar se é desta que abandona a presidência do governo regional.

publicado por Sílvia de Oliveira às 14:46
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