Segunda-feira, 21 de Setembro de 2009
Cavaco Silva é o Presidente de todos os portugueses, ou pelo menos assim deveria ser. E como qualquer presidente, quando fala, Cavaco deveria contribuir para aumentar o esclarecimento dos eleitores, e não alimentar dúvidas e suspeições. Mas na sua habitual e autoproclamada discrição e apertado sentido de Estado, o que o Presidente da República fez há dias foi precisamente o contrário, foi contribuir mais ainda para a confusão geral. A propósito das últimas notícias, que apontam o assessor presidencial, Fernando Lima, como a fonte das notícias de que a Presidência da República estaria a ser alvo de vigilância e de escutas por parte do Governo ou do PS, Cavaco Silva não confirmou nem desmentiu e preferiu fugir às perguntas importantes com más respostas. E disse: "Depois das eleições não deixarei de tentar obter mais informações sobre questões de segurança. O Presidente da República deve preocupar-se com questões de segurança." Acrescentou também que não é ingénuo e que nunca o veremos metido no meio de questões partidárias.
Assim, Cavaco só atirou mais poeira para os olhos dos muitos que, num exercício de cidadania, se preparam para ir votar nas eleições legislativas do próximo dia 27. Pensará o Presidente que ficarão imunes ao caso das alegadas escutas ao Presidente todos os que apontavam o seu voto para o PS ou para o PSD? Pensará o Presidente que as suas palavras não terão provocado mais indecisão e não poderão ter afastado ainda mais as pessoas dos partidos da governação, dos políticos, ou seja, das eleições?
É verdade que a desilusão dos portugueses face à política e aos políticos já não é notícia e que, como muitos dirão, já não há muita coisa capaz de destruir algo que quase não existe. Sim, de facto, uma parte significativa do eleitorado já estará tão cansada de ouvir falar de Freeport, do fim do Jornal da Manuela Moura Guedes, da compra de votos no PSD, das pressões ou da asfixia, democrática ou social. Sim, é verdade, que já tanto se disse e desdisse nesta campanha, que muitos passaram a assumir, há muito tempo, que o problema é transversal a todos os partidos. Um pensamento ao estilo do "eles são todos iguais...". E como tudo se arrasta em longas investigações sem um fim, sem inocentes ou culpados, o clima de suspeição passou a ser a normalidade. Mas esse não deve, nem pode ser o mundo de Cavaco Silva. O cargo de Presidente da República mantém-se como o último grande reduto de credibilidade política em Portugal. Não sendo um intocável, nem um justiceiro, o Presidente é o fiel da balança, o garante da verdade. Agora, Cavaco Silva comprometeu a sua Presidência. Deixou os portugueses, a uma semana das legislativas, sem qualquer resposta para um grave conflito entre o Presidente e um forte candidato a primeiro-ministro. Cavaco Silva não será o único com responsabilidades no esclarecimento deste caso das alegadas escutas em Belém, mas deveria ser o primeiro a tornar tudo claro. Não foi. Agora, está tudo, mesmo tudo nas suas mãos.
Terça-feira, 1 de Setembro de 2009
Tantas vezes foram enaltecidas as características depuradoras da crise, só é pena que a dita não seja capaz de expurgar do do país, já para não dizer desta galáxia, os que deveriam ficar calados para sempre. A começar por Dias Loureiro, o ex-conselheiro de Estado, suspeito da prática de vários crimes no âmbito do caso BPN. Aquele que durante anos e anos foi responsável, enquanto ministro de Cavaco Silva, pela Segurança do país, disse assim ao "Sol", a propósito de uns documentos descobertos em sua casa: "se essa documentação fosse de facto comprometedora, não a teria em minha casa ou já a tería destruído". É verdade, foi tudo isto que disse alguém que durante anos e anos participou nas reuniões do órgão político de consulta do Presidente da República.
O que chamar a Dias Loureiro, que nem tão pouco teve o pudor de aspirar palavras que envergonham tanta gente? O homem que garante estar de consciência tranquila e seguro da sua inocência assegura a quem quiser ouvir que se fosse preciso destruiria qualquer prova que o pudesse incriminar. Melhor não dizer mais nada, entregá-lo apenas às homenagens estivais em Aguiar da Beira e esperar que não volte a falar tão cedo.
É que a paciência que tantos pedem em tempo de crise pode não chegar. Só nos últimos dias, perdi boa parte dela em voos atrasados, em horas e horas de espera pelas malas, e lembrei-me logo dos prémios que o presidente da TAP recebeu, merecidos ou não, num ano de sacrifícios, e ainda dos maus trabalhadores, que os há por todo o lado e também numa empresa pública. Mas depois de uma Manuela Ferreira Leite, ao estilo "Conta-me como Foi", e do seu desapontante programa eleitoral, a paciência salva-se à conta da informação de que, afinal, as investigações ao caso Freeport estão quase concluídas e não envolvem Sócrates. Fonte do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, liderado por Cândida Almeida, garante ao "Diário de Notícias" que o primeiro-ministro vai ficar fora da acusação, pelo que nem sequer deverá ser ouvido como testemunha. Uma boa notícia, oportunamente divulgada antes das eleições, mas que exige o selo do procurador-geral da República. A voz é de quem vale a pena ouvir. Pinto Monteiro tem a obrigação de explicar tim-tim por tim-tim como é que se chegou a esta conclusão, sobretudo porque o departamento de Cândida Almeida tem sido duramente acusado de falta de independência na investigação deste caso. É que não haverá falta de paciência para ouvir o PGR e até os procuradores titulares do processo, Vítor Magalhães e Paes de Faria. Para que não restem dúvidas. A notícia de que José Sócrates, primeiro-ministro e candidato a primeiro-ministro, não recebeu dinheiro para facilitar a aprovação do Freeport é óptima, mas só depois de se afastarem todas as suspeitas que pairam sobre a liberdade do Ministério Público.