Quarta-feira, 12 de Agosto de 2009

aos belenenses sensíveis deste país

Nem Deus sabe a camada de nervos que apanhei à conta das críticas que João Bonifácio fez, no ano passado, aos concertos de Tom Waits e Leonard Cohen (que horas felizes vivi em Dublin e em Manchester!), nem tão pouco o quanto me senti vingada quando me contaram a história da gaffe do "ombro do teu cão", mas já não há paciência para a hiper-sensibilidade que parece afectar cada vez mais gente. Não terão os belenenses, com quem tanto simpatizo, nada de mais importante para fazer do que sentirem-se ofendidos pelo crítico do "Público".

O que Bonifácio escreveu, na crítica que fez ao concerto dos The Killers, foi: "O Belenenses joga e há duas dezenas de velhinhos nas bancadas, nem uma palha bule, é um sossego. (...) O povo esteve manso. (...) Foi a festa possível e foi escassa como os fins de tarde futebolísticos no Restelo costumam ser". E então, algum problema? Trata-se, como é óbvio, de uma metáfora, um estilo permitido na crítica, e ainda por cima bem conseguida. Que o digam os caríssimos belenenses. Num par de frases, ficamos a saber o que o crítico de música quis dizer sobre o concerto daquela banda. E então? Qual é a gravidade, por acaso é mentira?

Já a propósito de Cohen, Bonifácio escreveu isto no "Público" de 27 de Julho de 2008: "Conta a lenda que há mais de 30 anos Leonard Cohen, supremo esteta da filha-putice arrependida, entrou no palco para um concerto empinado num cavalo branco. Ontem, sacana maior de entre os sacanas que restam (Dylan, Waits, mais ninguém), entrou - sem cavalo - a passo de trote no palco montado no Passeio Marítimo de Algés." E não resisto a mais um excerto: "É outro Cohen: foi-se o ópio, a cocaína que usava para combater a depressão (e que odeia), as relações turbulentas com as mulheres, as quedas. Vestido de fato e chapéu pretos e camisa branca, Cohen fingiu, durante três horas, ser um cavalheiro sem dores de alma, mas é óbvio que ele é apenas o cavalheiro que a sua solidão o obriga a ser. E como se isso fosse pouco, ainda cantou."

E que acham, caríssimos belenenses? Acham que os fãns de Cohen, eu incluída, entupiram o e-mail do provedor do leitor? Claro que não (confesso apenas um telefonema de desabafo a um amigo...)! E sabem porquê? Imagino que terá sido por muitas razões, entre as quais a falta de tempo para tanto que fazer e ainda a profunda convicção de que, por este país, a opinião só deixa de ser livre quando se atenta contra o bom-nome e a honra de terceiros. A propósito, que diria Cohen, se tivesse lido o João Bonifácio? Eu imagino...

E o que terá a dizer Azeredo Lopes? Terá o presidente da ERC consciência que a igualdade de oportunidade no acesso aos meios de comunicação social das diferentes candidaturas não é o único e muito menos o mais importante princípio consagrado na Constituição?

Como diz António Barreto, importante é a liberdade de criticar, ainda que correndo o risco de ser injusto, de não dar importância ao que corre bem. É verdade, no estádio do Belenenses, a casa também já esteve cheia.

publicado por Sílvia de Oliveira às 19:29
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Terça-feira, 11 de Agosto de 2009

o desequilíbrio de balsemão

A história parece estar naquela fase de uma narrativa convencional em que quem vê já consegue adivinhar que alguma coisa de errado vai acontecer. Se fosse um filme, o espectador já sentia o frio na barriga e, há mais de meia hora, que pressentia o desequilíbrio na vida do protagonista.

Neste filme, Francisco Pinto Balsemão seria a personagem principal, dotado de características que permitem desenvolver empatia com o público. Bem disposto, relativamente feliz e bem sucedido na família e nos negócios, surge agora, depois da recente investida da Ongoing no negócio dos media, frágil, em risco de perder o seu império, do qual faz parte a SIC, a primeira estação de televisão privada de Portugal.

Nuno Vasconcellos seria o vilão, aquele que é capaz de desafiar a fraqueza de Balsemão, que tenta, por sua vez, lutar contra tudo e mais a falta de dinheiro para evitar um ataque à sua SIC. Um detalhe: o dono da Ongoing é filho de Luís Vasconcellos, durante muitos anos braço direito de Balsemão.

A cada dia que passa, os adversários parecem sair de todos os cantos. José Eduardo Moniz é o mais recente aliado de Nuno Vasconcellos. Arguto e profundo conhecedor dos insondáveis segredos do mundo da televisão, prometeu dar tudo por tudo e ajudar a criar um novo gigante da comunicação social. É ainda o rosto do conflito, sem o qual não há uma boa história. Fez frente ao primeiro-ministro, ao manter no ar na TVI, onde trabalhava até há poucos dias, o polémico Jornal de Sexta apresentado pela sua mulher, Manuela Moura Guedes.

E depois, existem as personagens secundárias, como a Prisa, dona do outro canal de televisão privado português. Está por cá, como podia não estar, é dona da TVI hoje, mas amanhã já a pode ter vendido, por exemplo, à Ongoing de Nuno Vasconcellos.

Como tudo o que ainda vai a meio, a história ainda pode dar muitas voltas. As personagens principais, provavelmente, mudarão os seus traços característicos, podendo subverter as expectativas do espectador. Balsemão pode revelar-se uma personagem falha e Nuno Vasconcellos ser afinal um herói. O protagonista pode até mudar.

Neste momento, trabalha-se ainda em vários cenários. Nuno Vasconcellos pode, de facto, assumir o controlo da SIC e com José Eduardo Moniz roubar a liderança à TVI. Balsemão pode não desejar o canal, como tudo leva a crer. Ou a Ongoing pode antes chegar a acordo com os espanhóis da Prisa e deixar Balsemão em paz. Ou pode ainda não conseguir nenhuma das duas porque era maior a ambição do que a sua força.

A única certeza é, para já, a de que, como nos filmes, o ciclo vai fechar-se. Não se sabe quando, nem como, mas o equilíbrio final jamais será igual ao do início. Nuno Vasconcellos quer ganhar protagonismo no sector da comunicação social em Portugal e, para que ele ganhe, alguém vai perder. Balsemão sabe disso. Seguindo os cinco estádios da narrativa, segundo Todorov, o dono da SIC já passou a fase do reconhecimento do desequilíbrio e vive a quarta: a tentativa de resolver o problema. De olhos colados ao écran.

publicado por Sílvia de Oliveira às 14:58
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Quinta-feira, 6 de Agosto de 2009

a obra de Isaltino não é arte

Voltas e mais voltas à cabeça, algum esforço de projecção, mas é difícil, praticamente impossível, entender quem mantém o voto em Isaltino Morais, depois de conhecida a pesada sentença do Tribunal de Sintra. O presidente da Câmara Municipal de Oeiras e candidato a um novo mandato, nas eleições de 11 de Outubro, foi condenado, na primeira instância, a uma pena de prisão efectiva de sete anos e à suspensão de mandato. Mas mesmo assim, a actriz Eunice Muñoz vai voltar a apoiar a sua reeleição. Ficaram provados, também na primeira instância, os crimes de fraude fiscal, abuso de poder, corrupção passiva e branqueamento de capitais, mas tamanho veredicto também parece não importar ao capitão de Abril Otelo Saraiva de Carvalho. E, como estes, estão mais oeirenses.

Ora, é no mínimo estranho, que quem tanto se queixa do funcionamento da justiça e dos políticos, em muitos casos com razão, tenha um repente e fique cego, logo agora que a justiça está a funcionar.

Isaltino Morais vai recorrer para o Tribunal da Relação e a decisão deste colectivo de juízes até pode vir a ser contrariada. É importante repetir que ninguém é culpado até trânsito em julgado, mas também é bom sublinhar que, neste momento, o que existe é um duro acórdão. O recurso de Isaltino não rasga este documento. E o que está lá escrito, palavra por palavra, é que Isaltino Morais cometeu, não um, mas quatro crimes.

Mas, mesmo assim, uma parte dos que votam em Oeiras, ao que parece significativa, está empenhada em depositar outra vez a sua confiança em Isaltino Morais, patrocinando, através do voto, a sua gestão camarária. Como se a familiaridade e os jardins, as boas estradas e todas as coisas bem feitas em Oeiras pela equipa de Isaltino valessem mais que uma decisão de um tribunal. Como se a obra fosse o que mais importasse, independentemente do seu criador.

Mas no final de tudo, o que aqui está em causa é grave e revela, sobretudo, duas coisas: mais um voto de desconfiança na justiça e uma tolerância indevida para com alguns políticos. Os que parecem ignorar a sentença, desejam que o tribunal tenha falhado, porque talvez pensem que, no meio da mediocridade que aparenta reinar pelo reino do poder local, pelo menos Isaltino tem obra feita. Imagino que pensem qualquer coisa como abusos há por todo o lado, este já sabemos quem é, o que faz e bem. Que confortável. Pouco interessa de que forma a obra aparece feita e se existiram ou não envelopes de dinheiro pelo meio. Que estranhos são os que, neste momento, parecem não duvidar de mais nada, a não ser da justiça. Estão no seu direito, apoiar a reeleição, arriscar uma conivência com práticas criminosas, como ficou, para já, provado em tribunal. Felizmente, nada nem ninguém proíbe, a não ser a consciência de cada um. Mas depois não se queixem da justiça e dos políticos, não se sentem nos bancos dos jardins de Oeiras a falar da aparente impunidade de alguns. A obra de Isaltino não é arte, não é de artistas que falamos. Votar não é o mesmo que desfrutar de uma bela sinfonia ou de um grande filme.

 

 

publicado por Sílvia de Oliveira às 18:16
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Segunda-feira, 3 de Agosto de 2009

o meu problema 2

 Tenho um problema. É crónico, mas não chega a ser grave. É uma sensação – não chega a ser estranha –, de que frequentemente os políticos me tratam como se fosse parva, praticamente acéfala. O que se intensifica sempre que se aproximam eleições, como é o caso.

 

Nos últimos dias, não faltou por aí quem me tenha querido fazer acreditar que é determinante, para eu decidir conscientemente em quem votar, que o PSD apresente já o seu programa eleitoral. Disseram-me de tudo: que se ele chegar apenas no final de Agosto, não terei tempo de o digerir durante o mês que então ainda faltará até às legislativas; que assim, os socialistas marcam desde já a agenda e o debate político; e que talvez Manuela Ferreira Leite não consiga, até lá, fazer muito mais do que imitar José Sócrates. Como se fossem só vantagens para o PS e só por causa disso, o meu rudimentar barómetro pessoal já estivesse em absoluta efervescência. Lembro-me, nem de propósito, que nas Europeias de Junho, o tempo também foi atirado contra o PSD porque este se atrasou na apresentação do cabeça de lista, mas que o tardio Paulo Rangel acabou por ganhar a Vital Moreira.

Depois, deram-me 120 páginas de programa PS – suspeito que, sem palavras repetidas, se poderia resumir em 20. Tentam convencer-me que grande parte não é mais do mesmo e que não me queimaram tempo e paciência quando dispensaram o eficaz asterisco. Poderia ter sido qualquer coisa do género: * leia mais no programa eleitoral de há quatro anos, ou lembre-se das políticas do Governo ao longo da última legislatura. E, como se já não fosse pouco, ainda pretendem seduzir-me com algumas medidas novas, como a da atribuição de 200 euros a cada bebé que nascer. Querem que acredite que se vai ter mais filhos só porque o Governo dará aos potenciais pais deste país aquele dinheiro para meter no banco, ainda que com o impedimento de lhe mexer antes dos desejados rebentos chegarem à universidade.

 

Mas há mais. Voltam com a conversa do costume, da redistribuição da riqueza, que deve ser mais equitativa, para me dizerem que a prioridade é a defesa da classe média e que, para que isso seja possível, há que tirar aos ricos. E mostram-me em euros o que são uns e outros. Não consigo evitar rir-me. Que parva!

Nem a Entidade Reguladora para a Comunicação Social me surpreende. Agora, a dinâmica ERC quer proibir os candidatos a qualquer cargo nas próximas eleições legislativas e autárquicas de emitirem opinião nos media. Imagino que temam que eu não saiba que a Manuela Ferreira Leite que escreve no Expresso é a mesma que se candidata ao cargo de primeiro-ministro.

 

Enfim, não chega a ser surpreendente, mas não deixa de ser preocupante a amostra de debate político que se fez até aqui, em plena fase de lançamento da campanha eleitoral, e quando Portugal tem pela frente a necessidade de matar duas crises, a mundial e, ainda mais difícil, a sua. Mas até pode ser insultuoso, num ano em que a Justiça, apenas um exemplo, se destaca pelas piores razões, com investigações criminais a ameaçar de morte os dois maiores partidos.

 

Tenho a sensação que a campanha não vai crescer, com programa do PSD e tudo, mas este deve apenas ser um problema só meu.

 

publicado por Sílvia de Oliveira às 12:33
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