As eleições autárquicas e legislativas devem realizar-se no mesmo dia. Aliás, não sei mesmo se em Portugal não se deveria votar para tudo de uma só vez.
E não é pelo pouco que se poupa – dava para as iluminações de Natal na Avenida da Liberdade, ironiza Francisco Louçã –, nem pela conveniência de limitar as idas às assembleias de voto, nem tão-pouco porque começa a faltar a paciência para a demagogia e o populismo das inenarráveis campanhas eleitorais. É, isso sim, pela defesa da democracia e pelo respeito devido pelos políticos aos eleitores. Quem votar em Lisboa não irá seguramente confundir José Sócrates com António Costa e muito menos Manuela Ferreira Leite com Pedro Santana Lopes. Como quem votar no Porto não irá encher os boletins de voto com cruzes no mesmo partido, só porque isso é mais fácil ou cómodo. Isso seria o mesmo que dizer que quem gosta de Manuela Ferreira Leite gosta de Pedro Santana Lopes – um exemplo absurdo para contrariar os que defendem que o povo é estúpido, preguiçoso e se baralha com muita facilidade. O mundo em Portugal não é unidimensional. Cada um vive a sua vida a várias dimensões e sabe perfeitamente distinguir os interesses da sua rua dos do país. A simultaneidade das eleições até poderá contribuir para o reforço da visibilidade das eleições autárquicas. Não terão os candidatos a câmaras municipais e juntas de freguesia de falar mais alto para se fazerem ouvir num palco onde os protagonistas naturais serão, sem dúvida, Sócrates e Manuela? E passará pela cabeça de alguém que um candidato a uma qualquer câmara deste país, por mais pequena que seja, se prepare para pouco ou nada fazer e descansar convencido dos resultados nacionais dos seus partidos? Ainda mais uma dúvida. Será sensato pensar que a vantagem de um partido nas autárquicas ou nas legislativas embala o eleitor no momento do voto? Pobres dos que pensarem que é assim que se ganham eleições. Mas, mesmo que esses consigam com esta espécie de estratégia conquistar os votos de alguns, então é porque estão bem uns para os outros – simplesmente merecem-se. A democracia tem muitas qualidades, mas, como é sabido, também tem os seus defeitos. Um deles é que dá trabalho. A todos. Aos que governam, aos que votam, porque têm de pensar para escolher, mas também aos que escolhem não pensar e se abstêm, deixando ao deus-dará o futuro – pesada palavra!
Os políticos deviam aprender com a filosofia do Twitter: dizer muito em pouco espaço, dizer muito em pouco tempo. Há 140 caracteres que dizem muito mais que discursos com muitas palavras e poucas ideias. Mas dá trabalho!
Ferreira Fernandes sobre a loura do Pacheco Pereira
Pacheco Pereira no seu abrupto
12:06 (JPP)
"Os crimes económicos têm sido investigados. Pela primeira vez, e tenho muito orgulho nisso, todos os bancos estão a ser investigados." Uma frase de uma longa entrevista do procurador-geral da República ao "Expresso" deste sábado. Uma frase perigosa:
"[...] todos os bancos estão a ser investigados." Será que Pinto Monteiro quis dizer que todos os bancos estão na mira da Procuradoria, como qualquer automobilista que circula pelas estradas de Portugal? Não sabemos. O procurador não foi claro, foi perigosamente vago e escancarou as portas à ambiguidade. Será que Pinto Monteiro quis dizer que todos os bancos – se se contasse com as caixas de crédito, falaríamos de mais de 200 – estão a ser investigados porque, se não existem suspeitas, existem pelo menos dúvidas sobre a sua conduta? Ou a referência era apenas a propósito da Operação Furacão? Também não se sabe.
Este é o perigo das declarações vagas e da generalização. Um risco vedado a certas pessoas, pela responsabilidade inerente aos cargos que ocupam. Os mesmos que têm ainda o dever do recato, o de assegurar a conformidade do estilo com a elevação do assunto.
A crise financeira abalou a confiança no sistema financeiro internacional, em particular nos bancos. E quase dois anos depois os banqueiros ainda não conseguiram recuperar o que parecia inabalável, a confiança dos seus clientes. Em Portugal, com os casos do Banco Português de Negócios (BPN) e do Banco Privado Português (BPP), a credibilidade vive momentos frágeis. A palavra "investigação" é, neste momento, o que basta para abalar as estruturas dos bancos, que se desejam sólidas, para bem de uma economia muito dependente do crédito.
Mas aqui a responsabilidade não é seguramente de Pinto Monteiro. Não há confiança que possa ser construída em cima da dúvida, e se há que investigar não se deve perder um único segundo.
Um bom exemplo é o caso Madoff, que rebentou em Dezembro do ano passado nos Estados Unidos. O antigo presidente do Nasdaq, que se declarou culpado por um megaesquema de fraude em pirâmide envolvendo investidores de todo o mundo, incluindo Portugal, conhece hoje a sua sentença, arriscando uma pena de 150 anos de prisão. Em pouco mais de seis meses, o caso está resolvido.
Já por cá, tudo é muito diferente, tudo se arrasta. No caso do BPN, o ex-presidente do banco está detido preventivamente há precisamente seis meses, sem que se pressintam para breve passos decisivos que conduzam a uma clarificação do processo. O facto não deve ser motivo de orgulho para ninguém, muito menos para Pinto Monteiro. Isto torna ainda mais incompreensível a frase perigosa do procurador, que deverá procurar satisfação, isso sim, na eficácia da investigação. A pergunta, porventura injusta – um risco que é corrido pelos jornalistas –, que apetece fazer a Pinto Monteiro é esta: de que serve tanta investigação se a sensação que existe é que nunca se chega a lado nenhum?
O Governo de sócrates tem toda a legitimidade, a apenas três meses das legislativas, para decidir o futuro do país, para aprovar e fazer avançar projectos estruturantes. Pois tem. Nada na Constituição impede este ou qualquer outro governo de investir em comboios de alta velocidade, em aeroportos, em mais travessias do Tejo e parcerias público-privadas para hospitais. Basta que esteja em funções e que as decisões não extravasem as suas competências. Pode, mas deve? Deve, a pouco tempo de se submeter a novo escrutínio, assumir compromissos de vários milhares de milhões de euros que irão comprometer os orçamentos do Estado dos próximos anos? Nas actuais circunstâncias, a resposta é não. É o bom senso, tão útil nestas coisas da vida, que o impede, e não o resultado das eleições europeias deste domingo. Não existindo, nesta pasta das grandes obras, consenso entre PS e PSD, os dois partidos que se revezam na governação, é sensato que quem está no poder faça uma pausa neste tipo de decisões que comprometem a vida de gerações.
A história é tão importante para nos conhecermos. A campanha para as legislativas de 2002 foi marcada pela polémica dos estádios. Portugal candidatou-se ao Euro 2004, era primeiro-ministro António Guterres e ministro do Desporto José Sócrates. Ficou decidida a construção de sete novos estádios e a remodelação de outros três. Investiram-se centenas de milhões de euros. Durão Barroso, na oposição, tornou-se primeiro-ministro poucos meses depois. Herdou um problema grave de défice das contas públicas. Estádios de futebol incluídos. É história.
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