Marcelo Rebelo de Sousa não tem razão quando sugeriu que Jorge Miranda não tinha o perfil certo para assumir o cargo de provedor de Justiça. Foi deliberadamente vago e pouco assertivo quando definiu qual deveria ser, na sua opinião, o perfil do sucessor de Nascimento Rodrigues. O constitucionalista Jorge Miranda não será seguramente um guru das novas tecnologias, não saberá o que é o Facebook ou o Twitter, não terá um iPod com várias playlists meticulosamente organizadas – segundo consta, não usa sequer telemóvel. Talvez também não esteja tão atento aos problemas da moderna sociedade de informação, mas tem tantas outras características, bem mais importantes, que o podem transformar num óptimo provedor. Mas disto, parecem esquecer-se Marcelo Rebelo de Sousa e o resto do PSD. A principal é o seu peso, a sua independência e credibilidade, a capacidade adquirida para se fazer ouvir. Quando Jorge Miranda abre a boca é escutado por quem importa, pelo Governo. Quando questiona a constitucionalidade de uma proposta de Lei, é frequente o professor conseguir travar o legislador.
Afinal, é, sobretudo, isso que se pede a um provedor de Justiça, que consiga ser uma espécie de oposição aos poderes públicos, sempre que a defesa dos cidadãos o justificar. E, como Manuela Ferreira Leite bem sabe, um líder de oposição tem que ser ouvido para ser eficaz. Sem ter que gritar, Jorge Miranda terá, se quiser, capacidade para transformar a quase desconhecida Provedoria de Justiça e dar-lhe a importância merecida. O papel de instituições vocacionadas para ouvir as pessoas não é nada despiciendo, tanto mais numa altura de crise, onde a tendência é para um aumento dos conflitos. As relações entre cidadãos e instituições não são sempre pacíficas e estão longe de ser equilibradas.
É isto que interessa: assegurar que os tempos de uma Provedoria discreta chegaram ao fim. Com a liderança de um protagonista. Se José Sócrates e Manuela Ferreira Leite não se conseguem entender em relação a um assunto tão simples, só pode ser birra.